domingo, 1 de abril de 2012

Chuva.

É curioso.
Olho todos os dias,
De forma interessada
E decerto inteligente
Para as gotas da chuva
Que caem à minha frente.

Tenho o problema
Que não passa na cabeça
De quase ninguém -
Praticamente nunca chove.
Por isso mesmo
Isto pode soar a mentira.

Mas não é mais que verdade.
Se eu vejo as gotas
Onde o meu ser
É reflectido perfeitamente,
É porque chove a potes,
Afirmação irrefutável.

Como pode uma pessoa
Que não vê pelos meus olhos
Dizer-me, de forma séria
E exaustivamente deliberada,
Que eu não vejo a chuva
E o meu reflexo nas suas gotas?

Má-vontade e arrogância!
Esses ignaros, de olhos vendados
Com as mãos suplentes
Que nunca utilizaram,
Provavelmente porque não sabiam
Que elas sequer existiam!

Mal têm tempo de perceber
Que o seu Mundo varia
De íris para íris,
Ao sabor da mentalidade
Do coração formado
Pelas dores individuais!

Pois que continuem a duvidar!
Eu cá continuo a ver-me,
Sobrancelhas franzidas
E cara molhada,
Boca mais que salgada,
Bochechas reluzentes!

Não pensem que é com gosto
Que me vejo nas gotas da chuva!
Eu nem aprecio muito este temporal.
Apenas estou numa frente fria,
Vinda da zona Norte da existência
Que decidiu a minha criação.

Aguardo pacientemente
Que este temporal passe.
Estico muitas vezes a mão
A pedir um guarda-chuva
Para não me constipar,
Porque perco-os sempre.

Serei louco por ser o único molhado?
Se calhar a chuva misteriosa
É um sinal da minha insanidade.
Enfim. Será impressão minha.
Continuo a ver a chuva e nas suas gotas,
Eu, na minha existência encharcada.

No entanto, gostava de me ver
Pelos olhos dos cegos
Que me classificam como louco.
Será que teria um corpo tão largo,
Um olhar tão vazio de foco,
Uma barba que teima em não crescer?

Um nariz que torto não se quer endireitar,
Uma testa alargada pelo conhecimento
Que julgo acumular para meu bem-estar?
Um cabelo desalinhado e preguiçoso,
Uma boca arrogantemente sarcástica,
Disfarce perfeito do poeta?

Poeta? Como me posso eu chamar de poeta?
Está certo que escrevo umas linhas,
Às vezes rimam e têm metáforas bonitas.
Mas isto que escrevo, desabafo confuso,
Poderá ser chamado de poesia?
Não sei, nem vou chegar a essa conclusão agora.

A única coisa que depreendo
Deste meu exercício alheio
Às regras impostas pelos idos génios
É que continuo sem respostas a perguntas
Que nunca fiz a ninguém, nem a mim.
E a chuva não parou de cair. Nem sei se parará.

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